CICLOVIDAS

As ciclovias são muito importantes para preservar vidas.
A criação de uma rede cicloviária é fundamental para democratizar o trânsito e dar segurança aos ciclistas e aos demais usuários do sistema viário.

domingo, junho 08, 2003

Ciclistas devem transitar na contramão???


Vez por outra aparece alguém na mídia criticando o comportamento dos ciclistas, por andarem na contramão de direção e sobre passeios e calçadas de vias urbanas. Mas os críticos não estão de todo certos. Igualmente ao pedestre, o ciclista pode andar com sua bicicleta sobre as calçadas e passeios públicos, desde que desmontado. Não obstante, pode ele circular montado em seu biciclo sobre calçadas e passeios em que haja sinalização que assim o permita, como se verifica junto a pouquíssimas ruas de Itajaí. Pode também o ciclista transitar no sentido contrário ao fluxo de veículos automotores, em vias dotadas com ciclofaixa. Além disso, se o novo Código de Trânsito Brasileiro - CTB (Lei n.° 9.503, de 23 de setembro de 1997) não deixa explícito que o ciclista não poderia transitar na contramão em vias de pista única, de um só ou com duplo sentido de direção, pode-se entender que nesse tipo de via a circulação de bicicletas na contramão de direção seria permitida.
Muita gente não possui recursos sequer para andar de ônibus. [Se não serve a grande número de pessoas, que motivo haveria para se privilegiar tanto o transporte de ônibus coletivos?] E a bicicleta, como meio de transporte popular de baixo custo, torna-se praticamente a única alternativa de veiculação da maioria dos proletários e seus familiares. Só que os ciclistas – compreendendo os cidadãos de todas as classes sociais que utilizam a bicicleta como meio de locomoção, lazer, esporte, etc. –, por causa da deficiente infra-estrutura viária, ficam expostos a toda sorte de perigo. Como a Cidade não dispõe de viação cicloviária apropriada (ver artigo: Itajaí não possui ciclovias!!! Diário do Litoral, de 10 e 11 de maio de 2003. p. 4), o biciclista geralmente vê-se obrigado a proceder de forma imprópria (?) no trânsito. Ou seja, para preservar sua vida, muitas vezes ele tem que circular em desacordo com certos preceitos legais. Seria um contra-senso apená-lo por defender sua integridade física.
Os ciclistas devem saber, todavia, que a legislação de trânsito estabelece equipamentos obrigatórios das bicicletas: campainha; sinalização noturna dianteira, traseira, lateral e dos pedais; e espelho retrovisor do lado esquerdo. Mas passados mais de cinco anos da publicação do novo CTB, a máxima parte das bicicletas em circulação ainda não está adaptada às exigências da lei. Além dessa irregularidade, também outras infrações de trânsito são cometidas por grande parte dos ciclistas.
Tem-se verificado que, além de não respeitar as normas de trânsito, bom número de ciclistas é negligente e imprudente. Embora devessem circular pelos bordos da pista de rolamento, junto à guia da calçada (meio-fio), em fila única, é comum dois ou mais ciclistas andarem lado a lado, ocupando a parte central da faixa por onde devem passar os veículos maiores. Por mais que os motoristas tenham cuidado, agindo dessa maneira os ciclistas correm grande risco de serem atropelados. Se andassem na contramão os ciclistas dificilmente se exporiam a bater “de cara” com um veículo automotor. O bom senso manda que seja permitida a circulação de bicicletas em sentido contrário ao deslocamento de veículos automotores, bem como sobre calçadas e passeios, principalmente em locais em que não haja prejuízo à circulação de pedestres ou de veículos motorizados.
Itajaí não possui nenhuma via municipal de trânsito rápido. No entanto, grande número de veículos motorizados circula em velocidade superior a 60 Km/h em muitas avenidas e ruas da cidade. [Na maioria das vias urbanas a velocidade máxima permitida é ou 40 Km/h ou 30 Km/h.] Isso acontece na maioria das vias arteriais, coletoras e locais, principalmente nas asfaltadas, independente de haver ou não redutores de velocidade. É sobretudo nessas vias onde os motoristas excedem aos limites máximos de velocidade estabelecidos que os ciclistas correm maior risco de vida, ou melhor – como diz atualmente a imprensa -, de morte. Infelizmente, os pequenos – pedestres e ciclistas – são geralmente as vítimas da guerra no trânsito. É por isso também que sempre é bom reavivar que os veículos de maior porte são responsáveis pela segurança dos menores, e que os biciclos têm preferência sobre os veículos automotores.
Se fosse perguntado que distância deve guardar ao passar ou ultrapassar bicicleta, a grande maioria dos condutores de veículos automotores não saberia responder corretamente, dado que dificilmente a distância regulamentar – que é de um metro e cinqüenta centímetros –, é respeitada. Salienta-se, todavia, que a prática dessa norma do CTB fica dificultada em um sem-número de ruas de cidades brasileiras, posto que nenhum veículo motorizado, exceto ciclomotor ou motocicleta, poderia passar ou ultrapassar ciclistas em vias estreitas. É o caso de vários logradouros de Itajaí, incluindo a rua Hercílio Luz, onde não se tem visto motorista algum respeitar essa norma de trânsito. Por sinal, mesmo sendo cometida essa infração de natureza média, os veículos não têm sido multados.
Apesar de ser um dos logradouros mais movimentados de Itajaí, em virtude de ser uma das vias de acesso e saída da cidade e de ter grande movimentação de ônibus e caminhões - por causa da rodoviária (mal localizada), dos depósitos de contêineres e dos armazéns frigoríficos ali existentes –, a avenida Gov. Adolfo Konder, embora possua áreas largas com calçadas e jardins, em ambos os lados, não contém ciclofaixa nem sinalização que permita ao biciclista circular pela calçada. Nos espaçosos passeios da rua Min. Victor Konder, às margens do Saco da Fazenda, também não existe sinalização indicativa de que a circulação de bicicletas seria permitida. Nesses locais, porém, para defender sua vida, o ciclista deve circular – de forma responsável, como, diga-se a propósito, deve ser em todo lugar – sobre a calçada, como, aliás, muitos, montados em seus biciclos, já o fazem. E em vários outros locais o ciclista precisa ignorar normas do CTB se quiser retornar para sua casa são e salvo. O mesmo não deve acontecer, por exemplo, na rua Hercílio Luz – uma das principais vias do Centro da cidade –, onde o trânsito de veículos é relativamente lento e em cujas calçadas circula grande número de pedestres. Em toda via de tráfego intenso de veículos automotores e de escassa circulação de pedestres não há por que não permitir a circulação de ciclistas sobre passeios e calçadas.
Os senadores, os deputados, os vereadores e os demais responsáveis pela elaboração da legislação de trânsito e aqueles que condenam os ciclistas por circular em desacordo com as normas de trânsito certamente não precisam arriscar sua vida utilizando bicicleta em seus deslocamentos pela selva urbana. Muitos ciclistas são atropelados e mortos justamente por respeitarem as normas de trânsito, andando no lado direito da via e no sentido do trânsito, conforme determinações do CTB. Se andasse na contramão da via – do lado esquerdo, na de mão-dupla, e num dos lados, na de sentido único –, o ciclista teria perfeitas condições de verificar se um automóvel, ônibus ou caminhão passaria longe dele ou se estaria na iminência de atropelá-lo; e antevendo tal situação de perigo, teria ele a chance de defender-se de um acidente e salvar sua vida.
Leis são necessárias (mas nem todas) e devem ser respeitadas. Não se está, portanto, defendendo a desobediência à lei. Mas tão somente procurando mostrar que, para salvar vidas, determinados dispositivos legais precisam ser reavaliados. A exemplo do que estabelece para o pedestre – no tocante a circulação em sentido contrário ao deslocamento de veículos, em certas vias –, ao qual em determinadas circunstâncias o ciclista equipara-se, em direitos e deveres, o CTB deveria dizer que a circulação de bicicletas se daria no sentido contrário ao fluxo de veículos automotores, em toda e qualquer via. Se a lei contém falhas, ela deve ser alterada. Ou seja, a fim de preservar vidas, devem os equívocos ou erros da legislação de trânsito ser corrigidos. Enfatiza-se que os órgãos e entidades de trânsito do Município têm competência para regulamentar, respeitadas as disposições do CTB, a circulação de ciclistas em vias públicas de sua circunscrição, inclusive sobre passeios e calçadas.
Nelson Heinzen,
Itajaí – SC.
[DL, 07-08/06/2003, p. 4]